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Seminário: Pessoas em situação de rua e autoridades debatem direitos de acesso à justiça

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Magistrados, defensores públicos, policiais, militares do Exército, assistentes sociais e pessoas em situação de rua se reuniram em um seminário que tratou sobre os direitos dessa população hipervulnerável, promovido pelas Escolas Superiores da Magistratura (Esmagis-MT) e da Defensoria Pública (Esdep-MT), na quarta-feira (06), no Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT).
 
O evento contou com palestrantes como o defensor público federal Renan Sotto Mayor, que tratou sobre a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 976, que instituiu o plano de ação e monitoramento para efetivação da política nacional para a população em situação de rua, a ser colocado em prática por Estados, Distrito Federal e Municípios; da juíza federal Luciana Ortiz Tavares Costa Zanoni e da juíza auxiliar da Presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Fabiana Pieruccini, que trataram a respeito da Resolução nº 425 do CNJ e da Política Nacional Judicial para pessoas em situação de rua.
 
Pieruccini explica que a Resolução 425 traz diretrizes pra que as pessoas em situação de rua tenham um tratamento empático e humanizado por parte do Poder Judiciário. “O objetivo principal é garantir o acesso dos serviços públicos e dos serviços de justiça para pessoas em situação de rua, que, muitas vezes, não têm documentação civil ou até mesmo trajes adequados para ingresso nos prédios públicos”, afirma.
 
Segundo ela, essa política judicial representa um novo olhar do Poder Judiciário para com esses cidadãos. “A população em situação de rua sofre muitos estigmas, muitas vezes atrelados a álcool, drogas ou questões criminais, que escondem uma realidade muito cruel, que é um processo de exclusão social, que acaba excluindo inclusive do acesso à justiça. Então existe um novo olhar, um olhar humanizado e que pretende distribuir o acesso à justiça a todos os cidadãos, independentemente deles terem ou não uma moradia permanente e convencional”.
 
O desembargador Mário Roberto Kono de Oliveira participou do debate e destacou a função desjudicializadora do Poder Judiciário em relação a esse público hipervulnerável. “Quando você fala em resgate de cidadania, quando você fala dos aspectos sociais, de tirar a pessoas da marginalização, de reintegrá-las à sociedade, você tem que pensar na justiça no seu caráter principalmente preventivo. Deixar um cidadão na marginalidade, a tendência é que é muito mais fácil ele procurar o ilícito porque as portas do que é lícito lhe estão sendo fechadas. Então, se você ver o que isso poderá originar de processos judiciais evitáveis, você vê que é muito mais prático, tem mais resultados e é bem menos oneroso”.
 
Dentre os representantes da população em situação de rua, participaram Anderson Miranda, coordenador-geral do Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento da Política Nacional para População em Situação e Rua do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania; José Vanilson Torres e Rubia Cristina de Jesus Silva, ambos representantes do Movimento Nacional de População em situação de Rua (MNPR). Eles estavam acompanhados de cerca de 50 pessoas que vivem em situação de rua em Cuiabá.
 
Coordenadora do MNPR em Mato Grosso, Rubia Cristina destacou a importância do Seminário. “Estou bem feliz de ver ali na sala que está no páreo. A gente não vê só representantes governamentais, mas também vê a população em situação de rua, pessoas que estão atrás de seus objetivos, justamente da moradia, que é o sonho de qualquer pessoa em situação de rua”, disse, reforçando a reivindicação por moradia, que, segundo ela, abre portas para outras oportunidades.
 
Ela pontuou situações de violações de direitos que essas pessoas sofrem nas ruas, devido ao preconceito e marginalização decorrente de sua condição de sem-teto e apontou o atual momento, em que o Poder Judiciário começa a ter um olhar humanizado para esse segmento da sociedade. “Não olhar pra nós só pra nos criminalizar porque estar recebendo a gente aqui, pra nós é um grande avanço, porque muitas das vezes a gente só passava por um juiz ou promotor só pra receber uma ‘condena’ ou uma voz de prisão de alguns policiais”.
 
Coordenador do Seminário sobre e para pessoas em situação de rua, o juiz Marcos Faleiros explicou que o evento foi pensado para que profissionais e esse público específico pudessem pensar juntos sobre a temática. “O seminário é muito importante para que o público especializado, juntamente com os próprias pessoas em situação de rua, possamos fazer uma reflexão sobre esse problema grave, não só trazendo dignidade como também visibilidade a esses cidadãos”. O magistrado defendeu ainda o protagonismo do Poder Judiciário no trabalho de conscientização, cidadania, dignidade e participação nas políticas públicas.
 
Representando a diretora-geral da Esmagis-MT, desembargadora Helena Maria Bezerra Ramos, a juíza Henriqueta Lima ressaltou que dados do Instituto de Pesquisa e Econômica Aplicada (IPEA) apontam que, entre 2012 e 2022, a população em situação de rua aumentou em 211%, o que reforça a necessidade de reconhecer que tratam-se de detentores de direitos. “É preciso que o Estado e a sociedade se atentem que são pessoas, detentoras de direitos, de uma vida digna e direitos fundamentais e elementares, como a moradia, água potável”, disse, complementando que o Seminário integra o projeto Umanizzare, da Esmagis-MT.
 
Coordenador da Escola Superior da Defensoria Pública Estadual, o defensor público Paulo Roberto Marquezini, lembrou que o seminário busca o aperfeiçoamento dos agentes públicos, além de dar maior visibilidade à população de rua e executar a política nacional para a população em situação de rua de maneira efetiva, resguardando direitos fundamentais, previstos na Constituição. “O primeiro deles, certamente, é o direito à moradia, mas para além desse, também o de participar da própria formação das políticas públicas, serem respeitados na sua posição, enquanto pessoa, além de determinados outros direitos como o de não violência e de inclusão”, defendeu.
 
#Paratodosverem – Esta matéria possui recursos de texto alternativo para promover a inclusão das pessoas com deficiência visual. Primeira imagem: Juíza auxiliar do CNJ, Fabiane Pieruccini fala ao microfone. Ela é uma mulher de pele clara, cabelos longos, lisos e pretos, usando óculos de grau, blusa bege e blazer branco risca-de-giz. Atrás dela, há uma bandeira vermelha com a logomarca do projeto Meninos e Meninas de Rua. Segunda imagem: Desembargador Mário Kono fala ao microfone. Ele está sentado em uma poltrona, com uma bandeira colorida do Movimento de População de Rua atrás, afixada na parede. Ele é um senhor de pele parda, traços orientais, cabelos grisalhos, usando camisa branca de bolinhas pretas e terno azul marinho. Terceira imagem: Coordenadora estadual do Movimento de População de Rua, Rubia Cristina, fala ao microfone. Ela é uma mulher parda, de olhos castanhos, cabelos castanhos e presos em coque, usando camiseta azul marinho do movimento. Quarta imagem: Plateia lotada prestigiando o evento.
 
Celly Silva/Fotos: Bruno Cidade/DPE
Coordenadoria de Comunicação da Presidência do TJMT
 
 

Fonte: Tribunal de Justiça de MT – MT

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Sistema de Justiça Criminal de MT debate câmeras corporais e vigilância

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O 6º Encontro do Sistema de Justiça Criminal de Mato Grosso, realizado na manhã de quinta-feira (29 de outubro), em Cuiabá, trouxe para o centro do debate um dos temas mais sensíveis e atuais da segurança pública e do direito: a implementação e o uso de tecnologias de vigilância, como as câmeras corporais (bodycams) e o reconhecimento facial. O encontro debateu a busca por maior segurança e transparência com a preservação dos direitos e garantias fundamentais.

Presidido pelo ministro Teodoro Silva Santos (STJ), o debate contou com a participação, como palestrante, do defensor público Fernando Rodolfo Mercês Moris (DP/SP), e como debatedores do promotor de Justiça Renee do Ó Souza (MPMT), do juiz de Direito Leonardo Issa Halah (TJSP) e do advogado Vinicius Segatto Jorge da Cunha (OAB/MT).

O tema central do painel foi o dilema entre a eficácia na prevenção e investigação de crimes por meio da tecnologia e a preservação dos direitos fundamentais, como a liberdade, a intimidade e a não discriminação. A discussão aprofundou-se na seguinte questão: se a adoção dessas tecnologias representa um dever do Estado de garantir a segurança pública e fiscalizar a atuação policial, ou se deve ser encarada primariamente como um direito social à transparência, à proteção de dados e à não violência.

O defensor público Fernando Moris abordou as complexidades das implicações do uso dessas tecnologias, especialmente no que tange aos direitos à privacidade, à proteção de dados e à forma como a tecnologia estabelece um novo status para a segurança pública. Segundo ele, as câmeras corporais retratam a dinâmica anímica dos fatos, e o reconhecimento facial por algoritmos levanta o questionamento sobre o papel da tecnologia como dado jurídico ou como substituto da testemunha presencial.

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O promotor de Justiça Renee do Ó Souza apresentou estudos e decisões que demonstram o impacto da tecnologia na atuação policial, destacando o chamado “efeito de resfriamento” observado em São Paulo, onde houve diminuição significativa de excessos na atuação dos agentes após a adoção das câmeras corporais. O promotor também alertou para a exposição de agentes públicos e de investigações técnicas, aspectos que, segundo ele, são frequentemente negligenciados.

O juiz Leonardo Issa Halah trouxe à discussão decisões relevantes, como o HC 598.051 do STJ, que estabeleceu parâmetros rigorosos para o ingresso policial em domicílios, e o RE 1.342.077 do STF, que relativizou a exigência de gravação audiovisual. Para o magistrado, é inadmissível que, em pleno ano de 2025, com tecnologia acessível ao Estado, não se utilize câmeras corporais como instrumento mínimo de auditabilidade e verificabilidade das diligências policiais.

O advogado Vinícius Segatto Jorge da Cunha destacou a importância da criação de novas formas de aferição da justiça e apontou a redução da letalidade como argumento suficiente para a adoção das câmeras corporais. Segundo ele, esse mecanismo também contribui para a preservação da cadeia de custódia e evita condenações baseadas exclusivamente em provas testemunhais.

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O ministro Teodoro Silva Santos parabenizou o debate e reforçou que o tema está em constante evolução, exigindo um marco regulatório sólido que garanta que o avanço tecnológico na segurança pública não resulte em retrocessos nos direitos individuais, e que não há respostas fáceis para a tensão entre o dever estatal de garantir segurança e o direito social à privacidade, sendo essa uma das principais tensões democráticas do século XXI. “A relação entre os direitos fundamentais e a segurança pública deve ser analisada sob a perspectiva da harmonização e da preponderância dos valores constitucionais, sempre em prol das garantias fundamentais”, defendeu o ministro.

O consenso estabelecido foi de que a tecnologia é uma ferramenta cujo uso deve estar sempre submetido aos princípios da legalidade, necessidade, proporcionalidade e, acima de tudo, ao respeito à dignidade da pessoa humana.

Autor: Júlia Munhoz

Fotografo: Josi Dias

Departamento: MPMT

Email: [email protected]

Fonte: Tribunal de Justiça de MT – MT

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